segunda-feira, 25 de junho de 2012

"O furto de cobre", por Fernanda Palma

O furto de cobre é hoje, em Portugal, a expressão de uma certa organização "caseira" da criminalidade. Sabe-se que o valor económico do cobre tem originado a criação de redes que, em alguns casos, têm uma base familiar. O furto de cobre surge, nesse contexto, como uma atividade económica continuada, que se chega a projetar, por vezes, na exportação.
Em situações com esta dimensão social e perante crimes tão frequentes, é indispensável tomar medidas no plano da prevenção e da investigação criminal. E assim se explica também que, no plano legislativo, a anunciada proposta de reforma penal preconize, segundo foi noticiado pela comunicação social, a agravação das penas aplicáveis aos furtos de metais.
Se a leitura da comunicação social for fiel ao pensamento legislativo, pretende-se uma qualificação automática desses crimes. O fundamento de tal qualificação, e da consequente agravação das penas em todos os casos, assenta nos danos sociais causados pelos crimes, que podem pôr em causa infraestruturas estratégicas, como as telecomunicações ou a rede elétrica.
Na verdade, estes danos sociais constituiriam justificação bastante para agravar os furtos de metais, se o Código Penal não contemplasse já a qualificação desses furtos em várias situações efetivamente graves. Porém, o Código Penal já prevê penas de prisão até cinco anos (idênticas às agora propostas) ou mesmo até oito anos, para furtos especialmente graves.
Assim, se, por exemplo, o furto de cobre não for um ato isolado e se inserir no contexto de uma atividade reiterada ("modo de vida"), é aplicável uma pena de prisão até cinco anos. E se os crimes forem cometidos pelo membro de um bando com a colaboração de outro membro desse bando, a pena aplicável será de dois a oito anos de prisão.
O Código Penal prevê várias outras circunstâncias que podem conduzir à qualificação do furto de metais, relacionadas, designadamente, com o valor ou a segurança da coisa furtada, a detenção de arma pelo autor do crime e a situação da vítima. Estas circunstâncias formam um sistema coerente, no plano lógico e valorativo, cuja alteração deve ser bem ponderada.
É verdade que uma política criminal impulsiva, que responda instantaneamente aos problemas conjunturais da sociedade, agravando penas ou criminalizando condutas, pode estabilizar, a curto prazo, as emoções sociais geradas pelo crime. Todavia, uma tal política arrisca-se a introduzir injustiças relativas e a fazer cedências à responsabilidade objetiva.
Por:Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal,a quem, com a devida vénia se agradece.Foi também publicado no "Correio da Manhã".

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